quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Um Amor Mouro - I

Ela resmungou alguma coisa e logo depois cobriu o pedaço de perna que estava de fora do seu longo vestido, cor do mar. Eu a alertei pela segunda vez que logo, ela teria de subir para o seu quarto. E pela segunda vez ela fingiu não escutar, começa a cantarolar e enrolar entre os dedos um dos seus cachos ralos.
O cheiro de rosas subiu, e muitos dos outros a nossa volta, se viraram olhando para ela de forma gananciosa.
Eu odiava quando ela descia. Odiava fechar os olhos, odiava dormir. Ela sempre descia, quase todas as noites, e por isso tinha que me manter desperto. Só havia homens perto de mim, homens sem suas mulheres. Todas estavam longe. Só eu sabia o perigo que a rodeava, eu e seu pai, mas esse não sabia que ela descia.
Ela me dizia sorrindo dentes de criança, pequenos e redondos “Não vejo maldade em nenhum deles... Estão sofrendo, não fariam o mesmo.” Ela era o parecia ser. Pura.
Eu nunca tinha conhecido uma pessoa assim, uma pessoa como ela. Quando criança já havia ouvido falar de mulheres da cor da Lua, que eram o oposto do meu ser. Contavam-me que nós da terra da noite roubamos deles o Sol e eles a nossa Lua. É horrível não se lembrar das situações com nitidez, queria me lembrar dessa história, queria contar para ela. E como sempre quando conversávamos, ela me olharia atenta e a cada surpresa e graça, me presentearia com uma nova expressão.
Fechei a cara para todos eles, e logo tirei a vista e fingi pensar, olhando para o pequeno pedaço de chão que achei entre tantos pés amontoados. Não era tão forte, não sabia lutar melhor que alguns a minha volta, havia muitos guerreiros, derrotados, mas havia. Se todos se voltassem contra mim, perderia. E sentia que essa hora estava chegando.
- Quero que suba! – disse apenas para que ela escutasse.
- Amanhã, eu não precisarei acordar cedo. – ela segurou uma das minhas mãos e passou seu dedo pelos meus calos e arranhões.
- Eu quero que você suba, e não venha amanhã. – ela continuou atenta no meu pulso machucado pela corrente que o prendia.
- Me conta mais uma vez. – ela mandou, sem me olhar.
Por que ela parecia uma criança? Respirei fundo, sem achar uma resposta.
- Uma menina olhou para mim, e dentro dos seus olhos eu me vi. Meninas assim não existem onde eu nasci. Meninas de nariz pequeno..., tudo pequeno. Ela sorriu para mim e jogou seu longo cabelo para trás, e eu também nunca tinha visto um cabelo assim. Quando ela me olhou novamente eu já estava no chão, de boca sangrando, estava desdentado. Quando eu a olhei novamente, não havia mais homens sobre mim. Acabou enjoou, acabou medo, acabou solidão. Começou outro medo, começou outra sensação. E você só vai subir se eu lhe disser que no fim, o Sol encontrou a Lua.
Ela me beijou, enchendo a minha boca de um gosto doce e refrescante. Eu fiquei envergonhado do gosto sujo e grosso que deixei na dela. Ela me abraçou com força, esfregando seu vestido em mim, fazia o que não gostava que fizesse grudar meu cheiro nele. Depois se foi, desejando boa noite a todos que não tinham vergonha de mostrar que a olhavam, pois todos olhavam. Tinha certeza que para todos á melhor hora era quando ela chegava e ia. Para mim era o tempo que passávamos juntos.

Nenhum comentário: