quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Um Amor Mouro - IV

Saí e um dos marujos, tocava um pequeno instrumento, que me lembrou uma miniatura do violão que meu primo tocava nas noites de verão. O som era animado e ele começou a cantar, e gritou “bons marujos não negam uma dança!” Não pude negar.
Girei em volta de mim mesma, muitas e muitas vezes, como sempre fazia quando criança. A sua canção contava a história de um capitão que queimava seu barco, para iluminar o céu, em suas noites solitárias sem suas mulheres de pequenos olhos. Ele colocou seu chapéu em minha cabeça e pediu que o acompanhasse.
- Dedos de quê? – lhe perguntei sem entender seu ultimo verso.
- Em dedos de mel, nos perdemos, pobres marujos. – ele me ensinou, com paciência.
Se mulheres voam não saberei.
Se brumas é do que o mar é feito...
Dedos de mel, nos perdemos, pobres marujos.
Queimarei meu navio. Queimarei meu navio.
Iorrou,iorrou, queimarei meu navio.
Saudades terei, terei, de minhas mulheres.
Então viverei, nessa escuridão, como teus olhos pequenos.
Dedos de mel, nos perdemos, pobres marujos..
.”
Meu pai me olhava. Então acabamos e segui, ainda rindo para meu quarto. Chamei o homem e lhe joguei seu chapéu, ele agradeceu pomposamente, e se desequilibrou, rimos juntos.
- Eu irei dormir, se vocês puderem, por favor, façam silêncio. – me deitei nos panos que arrastei até o chão.
Nenhuma das duas tinha feito nada. Mas já que não poderia ficar sozinha em meu quarto, poderia ficar sozinha em meu silêncio.
- Não vai se trocar? – a mais velha das duas disse, passando a mão pelo meu vestido ensopado.
- Não! – puxei meu vestido.
Queria silêncio, mas parecia ser muito para as duas. Discutiram perto de mim, o que poderia me acontecer por ficar vestida com aquele vestido molhado. Não me importava, queria ficar doente, estar prestes á morte, não me importava. Imaginava meu lindo vindo me ver, indo cuidar de mim, me perguntando de que forma gosto o chá, e se as cobertas estão quentes o suficiente.
- Que som é esse? – uma olhou para a cara da outra, assustadas.
- Não saia! – a mais nova repreendeu a mais velha.
O som de correria, vozes altas e algumas risadas contidas, eram ouvidos do lado de fora do quarto. O meu pai tinha cumprido sua promessa.
Corri e tranquei a porta, sob o olhar assustado das duas intrusas.
– Que horas são? – perguntei.
- Logo vai anoitecer. – uma delas disse.
- Ninguém sai até escurecer. – dei a chave a mais velha e pedi que guardasse.
Voltei a me deitar e comecei a rezar, pra que Deus me desse, força para não arrancar a chave das mãos daquela mulher, abrir a porta e sair correndo atrás do meu amor. Não poderia por tudo a perder, não poderia entregar a meu pai os meus segredos.
- Por que a senhorita estar chorando? – me perguntaram.
O som das vozes de todos em coro, cantando, entrava pelas janelas do meu quarto. O meu amor estava vendo o por do sol, as nuvens alaranjadas no céu, a imensidão do mar. Ele estava bem, e esperava que feliz, não podia estar ao seu lado, mas minha mente se mantinha ocupada pensando nele.
Queria poder, pegar aquela cena e transcrever. Queria dá vida as palavras e mostrar a beleza de todo aquele momento. O coração do meu amor ainda batia, não existiria nada melhor. Queria desobedecer minhas regras, e amar o meu amor onde tudo começou.
Ouvir seu chamado e não poder ir ao seu encontro, era tortura demais!
Não durou muito. O Sol pareceu ouvir as frases horrorosas que os marinheiros falavam aos negros, humilhavam sua cor, seu estado, sua miséria, e se pôs mais cedo que o esperado.
Eles pararam de cantar. Ouvimos do quarto, todos passarem, serem arrastados e novamente silêncio.
- Pela manhã levarei vocês até meu pai. – disse tentando ocultar a tristeza em meu olhar.
Elas me olharam implorantes e desesperadas
- Tenham, calma! Assim vocês me assustam. O que falarei com ele não prejudicará nenhuma. – me virei, me cobrindo toda.
Dentro do quarto tudo parou. As duas deveria não acreditar no que dizia, mas eu não devia mais explicações, por mim não acreditavam. A minha tristeza era maior, e estava crescendo à medida que a saudade vinha junto. Esperava que o que pretendia fazer por elas, não me prejudicasse em nada.
Esperei...

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