quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Um Amor Mouro - III

Subi e olhei o mar, com as duas a tiracolo, as ondas batiam com força e pingos me alcançaram. Alegrei-me por um momento, mas no outro me lembrei de que o porão deveria estar coberto por água. Que todos que estivessem lá, estavam molhados e presos. Desci o mais rápido que pude e vi os guardas, tinha que me libertar delas e pedi que fossem pegar para mim varias coisas em meu quarto. Corri para a cozinha e quando tive a oportunidade de não ser vista, desci pela abertura no chão e cheguei no porão.
Eu caia sobre um pequeno espaço, entre a escada e a parede de madeira. A água batia na minha cintura e estava sobre a escada. Entre a mensidão de homens amontoados vi o meu. Ele estava preso de forma horrenda, grudado ao chão graças a correntes enormes. Meu coração me alertou o que eu já via. Corri, pedi licença, mas a maioria não me entedia, estavam casados, preocupados, sofridos. Mas eu queria alcançá-lo, queria ajudar, minha preocupação só aumentava à medida que me aproximava.
Puxei sua cabeça, a enterrei entre meus braços. Pedi desculpas, todas as desculpas que ele merecia, eu chorei por ele, por todos. Ele tentou levantar os braços, mas as correntes impediram que tomassem seus destinos, minha boca. Ele queria me calar.
- O que você faz aqui Clara? – ele me olhou desgostoso.
- Te ver. – o barco balançou com força e a água molhou minhas costas.
- Suba. Vá para o seu quarto. Te pedi para não vir hoje. – ele balançou sua cabeça, tirando minhas mãos dela.
- Eu estava no meu quarto, mas eu me preocupei... – tentei beijá-lo, mas ele virou o rosto.
- Você não me respeita! – ele falou com raiva.
Ele estava brigando comigo? Mas eu queria vê-lo, queria cuidar dos seus machucados e dos novos que via em seu pescoço e ombros. Queria tirá-lo dali e deitá-lo em minha cama, acabar com aquele seu sofrimento.
- Eu quero que você me escute. Não vou falar mais. Vá embora! Não te quero aqui! Saí de cima de mim, não te quero por perto! – ele se balançou, tentando me tirar de cima do seu corpo.
Apertei minhas pernas em volta de sua cintura. Abracei seu tronco e pousei meu rosto em seu pescoço, ele soltou uma exclamação e fez um som de bicho, falando em sua língua. Mas eu não escutei, queria ficar ali, perto dele.
- Você quer me prejudicar. – ele disse já calmo.
- Não... Como assim? – perguntei , sem entender o que ele queira dizer com aquilo.
- Seu pai. Onde ele estar? Ele sabe que você esta aqui..., com um preto? – ele disse irritado.
Olhei em volta, todos me olhavam. Ele não precisava me dizer aquilo, eu só iria embora quando quisesse. Meu pai era o mínimo em relação a tudo, o problema dele era comigo. Ele não me queria ali em baixo, por algum motivo me queria longe. Talvez vergonha de sua situação, ou raiva da minha posição.
Envergonhada estava eu. Por ser uma mulher, uma mísera iniciante a mulher. Por não fazer mudança, minha situação era a pior, amar e travar uma briga eterna com seu amor, para que acredite no que sinto, e uma briga com o mundo, que ria de mim.
A minha posição é a mais humilhante, ser filha, de um homem que me tolera. Que me aceita por parecer com sua mãe, uma velha de onde não se resta nem pó. Por ser um criança, mimada e burra, filha de um homem que nem me conhece.
Eu me levantei, teria saído pela entrada, mas o meu grande final prejudicaria a todos, crescer estava sendo horrível. Quando cheguei à porta de meu quarto, escutei que as duas brigavam, dei meia-volta e fui falar a meu pai.
- É isso que lhe peço. – disse no fim do meu longo e detalhado pedido.
- E o que você me dará em troca disso? – ele falou sem maldade alguma.
- Ficarei devendo. Um dia você poderá me cobrar. – me levantei.
Já me dirigia à porta, mas ele voltou a falar.
- Fisicamente você parece com sua avó, mas a cada dia me vejo mais em você, do que um dia cheguei a imaginar. – ele saltou uma baforada de fumaça.
- Papai, então não terei pressa.

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